terça-feira, 12 de outubro de 2010

Satori

Satori significa literalmente entender, em japonês. É uma iluminação, uma expansão da consciência equivalente aos termos sânscritos Nirvana e Samadhi. O Satori é uma espécie de percepção interior - não naturalmente a percepção de um objeto específico, mas, por assim dizer, a faculdade de sentir a verdadeira realidade. É uma percepção de ordem mais elevada.

"O que nos surpreende na prática do tiro com arco e na ordem de outras artes que se cultivam no Japão (e provavelmente também em outros países do Extremo Oriente) é que não tem como objetivo nem resultados práticos, nem o aprimoramento do prazer estético, mas exercitar a consciência, com a finalidade de fazê-la atingir a realidade última – ou seja, o nirvana, um estado de iluminação suprema, para além da concepção do intelecto. A meta do arqueiro não é apenas atingir o alvo; a espada não é empunhada para derrotar o adversário; o dançarino não dança unicamente com a finalidade de executar movimentos harmoniosos. O que eles pretendem, antes de tudo, é harmonizar o consciente com o inconsciente.
Para ser um autêntico arqueiro, o domínio técnico é insuficiente. É necessário transcendê-lo, de tal maneira que ele se converta numa arte sem arte, emanada do inconsciente.
No tiro com arco, arqueiro e alvo deixam de ser entidades opostas, mas uma única e mesma realidade. O arqueiro não está consciente do seu "eu", como alguém que esteja empenhado unicamente em acertar o alvo. Mas esse estado de não-consciência só é possível alcançar se o arqueiro estiver desprendido de si próprio, sem, contudo, desprezar a habilidade e o preparo técnico. Dessa maneira, o arqueiro consegue um resultado em tudo diferente do que obtém o esportista, e que não pode ser alcançado simplesmente com o estudo metódico e exaustivo.
Esse resultado, que pertence a uma ordem tão diferente da meramente esportista, se chama
satori, cujo significado aproximado é "intuição", mas que nada tem a ver com o que vulgarmente assim se denomina. Prefiro, por isso, chamá-lo de intuição prájnica. Podemos traduzir prajnâ como sabedoria transcendental, embora essa expressão tampouco reflita os múltiplos e ricos matizes contidos nessa palavra, porquanto se trata de uma intuição especial, que capta simultaneamente a totalidade e a individualidade de todas as coisas. Essa intuição reconhece, sem nenhuma espécie de meditação, que o zero é o infinito e que o infinito é o zero. E isso não constitui uma indicação simbólica ou matemática, mas uma experiência diretamente apreensível, resultante de uma experiência direta. Psicologicamente falando, o satori consiste numa transcendência dos limites do ego. Do ponto de vista lógico, é a percepção da síntese da afirmação e da negação. Metafisicamente, é a apreensão intuitiva de que ser é vir a ser e vir a ser é ser."
(D. T. Suzuki em A Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen, de Eugen Herrigel)

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